35 sonets,
Fernando Pessoa,
Lisbon, Ed. Monteiro Co.
1918
Antinous, a poem
by
Fernando Pessoa,
Lisbon, Ed. Monteiro Co.,
1921
English Poems I,
II by
Fernando Pessoa,
Lisbon, Olisipo, 1921
English Poems III,
Lisbon, Olisipo, 1921 Mensagem,
Lisboa,1934
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A
obra de Fernando Pessoa
foi quase toda publicada após sua morte em 1935. Portanto, serão
citados alguns livros lançados no Brasil e em Portugal, postumamente.
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Obras Completas
de Fernando Pessoa,
Lisboa, Ed. Ática.
Poesias de Fernando
Pessoa, 1ª ed. 1942
Poesias de Álvaro
de Campos, 1ª ed. 1944
Poemas de Alberto
Caeiro, 1ª ed. 1946
Odes de Ricardo Reis,
1ª ed.1946
Mensagem,
Fernando Pessoa,
3ª ed. 1945
Poemas Dramáticos, de Fernando Pessoa,
1ª ed 1952
Poesias Inéditas
de Fernando Pessoa (1930-1935), 1ª ed. 1955
Poesias inéditas
de Fernando Pessoa
(1919-1935), 1ª ed. 1956
Quadras ao Gosto Popular
de Fernando Pessoa,
1ª ed. 1965
Novas Poesias Inéditas,
de Fernando Pessoa,
1ª ed.1973
Poemas Ingleses publicados por Fernando
Pessoa,
1ª ed. 1974
Obra Poética de Fernando Pessoa, Lisboa,
Publicações Europa-América, 1986
O Guardador de Rebanhos,
de Alberto Caeiro, edição fac-similada, Lisboa,
Ed. Dom Quixote, 1986
Primeiro Fausto, São Paulo, Edições
Epopeia, 1986.
Obra poética,
Rio de Janeiro,
Nova Aguilar
Livro do Desassossego,
(por Bernardo Soares)
São Paulo, Brasiliense.
Primeiro Fausto, São Paulo, Iluminuras.
Ficções do Interlúdio,
São Paulo, Cia. das Letras,
Mensagem,
São Paulo, Cia. das Letras,
Obras em Prosa,
Rio de Janeiro,
Nova Aguilar, 1974.
Obras em Prosa de Fernando Pessoa, Lisboa,
publicações europa-América, 1987. |
"Amamos sempre no que temos o que não
temos quando amamos."
§
"Viver não é necessário; o que é
necessário é criar. "
§
"Tenho pensamentos que, se pudesse
revelá-los e fazê-los viver, acrescentariam nova luminosidade às estrelas, nova beleza
ao mundo e maior amor ao coração dos homens."
§
"O artista como artista sente menos do
que os outros homens porque produz ao mesmo tempo que sente, e nesse caso há uma
dualidade de espírito incompatível com o estar entregue a um sentimento."
§
"Se alguma vez sou coerente, é apenas
como incoerência saída da incoerência."
§
"Exceto nas coisas intelectuais, onde
cheguei a conclusões que tenho como firmes, mudo de opinião dez vezes por dia; só tenho
juízo assentado a respeito de coisas em que não haja possibilidade de emoção."
§
"A origem mental dos meus heterônimos
está na minha tendência orgânica para a despersonalização e para a simulação."
§
"não há que buscar em qualquer deles
(dos heterônimos) idéias ou sentimentos meus, pois que muitos deles exprimem idéias que
não aceito, sentimentos que nunca tive. Há simplesmente que os ler como estão, que é
aliás como se deve ler"
§
"Quero sempre fazer, ao mesmo tempo,
três ou quatro coisas diferentes; mas no fundo não só não faço, mas não quero mesmo
fazer nenhuma delas. A ação pesa sobre mim como uma danação: agir, para mim, é
violentar-me".
§
"Eu sou a sensação minha.
Portanto, nem da minha própria existência estou certo."
§
"Só disfarçado é que sou eu."
|
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XL - PASSA UMA BORBOLETA
(do "Guardador
de Rebanhos" - Alberto Caeiro)
Passa uma borboleta por diante de mim
E pela primeira vez no Universo eu reparo
Que as borboletas não têm cor nem movimento,
Assim como as flores não têm perfume nem cor.
A cor é que tem cor nas asas da borboleta,
No movimento da borboleta o movimento é que se move,
O perfume é que tem perfume no perfume da flor.
A borboleta é apenas borboleta
E a flor é apenas flor.
AUTOPSICOGRAFIA
O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.
E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.
.
Nesta vida, em que
sou meu sono,
Não sou meu dono,
Quem sou é quem me ignoro e vive
Através desta névoa que sou eu
Todas as vidas que eu outrora tive,
Numa só vida.
Mar sou; baixo marulho ao alto rujo,
Mas minha cor vem do meu alto céu,
E só me encontro quando de mim fujo.
Quem quando eu era infante
me guiava
Senão a vera alma que em
mim estava?
Atada pelos braços
corporais,
Não podia ser mais.
Mas, certo, um gesto, olhar
ou esquecimento
Também, aos olhos de quem
bem olhasse
A Presença Real sob
disfarce
Da minha alma presente sem
intento.
Pousa
um momento,
Um só momento em mim,
Não só o olhar, também o pensamento.
Que a vida tenha fim
Nesse momento!
No olhar a alma também
Olhando-me, e eu a ver
Tudo quanto de ti teu olhar tem.
A ver até esquecer
Que tu és tu também.
Só tua alma sem tu
Só o teu pensamento
E eu onde, alma sem eu. Tudo o que sou
Ficou com o momento
E o momento parou.
POEMA
EM LINHA RETA
(Álvaro
de Campos)
Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo.
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado
[sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.
Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...
Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó principes, meus irmãos,
Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?
Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?
Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.
(Alberto Caeiro)
Não basta abrir a janela
Para ver os campos e o rio.
Não é bastante não ser cego
Para ver as árvores e as flores.
É preciso também não ter filosofia nenhuma.
Com filosofia não há árvores: há idéias apenas.
Há só cada um de nós, como uma cave.
Há só uma janela fechada, e todo o mundo lá fora;
E um sonho do que se poderia ver se a janela se abrisse,
Que nunca é o que se vê quando se abre a janela.
LISBON REVISITED (1926)
(Álvaro de Campos)
Nada me prende a nada.
Quero cinqüenta coisas ao mesmo tempo.
Anseio com uma angústia de fome de carne
O que não sei que seja -
Definidamente pelo indefinido...
Durmo irrequieto, e vivo num sonhar irrequieto
De quem dorme irrequieto, metade a sonhar.
Fecharam-me todas as portas abstratas e necessárias.
Correram cortinas de todas as hipóteses que eu poderia ver da rua.
Não há na travessa achada o número da porta que me deram.
Acordei para a mesma vida para que tinha adormecido.
Até os meus exércitos sonhados sofreram derrota.
Até os meus sonhos se sentiram falsos ao serem sonhados.
Até a vida só desejada me farta - até essa vida...
Compreendo a intervalos desconexos;
Escrevo por lapsos de cansaço;
E um tédio que é até do tédio arroja-me à praia.
Não sei que destino ou futuro compete à minha angústia sem leme;
Não sei que ilhas do sul impossível aguardam-me naufrago;
ou que palmares de literatura me darão ao menos um verso.
Não, não sei isto, nem outra coisa, nem coisa nenhuma...
E, no fundo do meu espírito, onde sonho o que sonhei,
Nos campos últimos da alma, onde memoro sem causa
(E o passado é uma névoa natural de lágrimas falsas),
Nas estradas e atalhos das florestas longínquas
Onde supus o meu ser,
Fogem desmantelados, últimos restos
Da ilusão final,
Os meus exércitos sonhados, derrotados sem ter sido,
As minhas cortes por existir, esfaceladas em Deus.
Outra vez te revejo,
Cidade da minha infância pavorosamente perdida...
Cidade triste
e alegre, outra vez sonho aqui...
Eu? Mas sou eu o mesmo
que aqui vivi, e aqui voltei,
E aqui tornei a voltar, e a voltar.
E aqui de novo tornei a voltar?
Ou somos todos os Eu que estive aqui ou estiveram,
Uma série de contas-entes ligados por um fio-memória,
Uma série de sonhos de mim de alguém de fora de mim?
Outra vez te revejo,
Com o coração mais longínquo, a alma menos minha.
Outra vez te revejo
- Lisboa e Tejo e tudo -,
Transeunte inútil de ti e de mim,
Estrangeiro aqui como em toda a parte,
Casual na vida como na alma,
Fantasma a errar em salas de recordações,
Ao ruído dos ratos e das tábuas que rangem
No castelo maldito de ter que viver...
Outra vez te revejo,
Sombra que passa através das sombras, e brilha
Um momento a uma luz fúnebre desconhecida,
E entra na noite como um rastro de barco se perde
Na água que deixa de se ouvir...
Outra vez te revejo,
Mas, ai, a mim não me revejo!
Partiu-se o espelho mágico em que me revia idêntico,
E em cada fragmento fatídico vejo só um bocado de mim -
Um bocado de ti e de mim!...
XX
- O TEJO É MAIS BELO
(do "Guardador de Rebanhos" - Alberto Caeiro)
O
Tejo é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia,
Mas o Tejo não é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia
Porque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia.
O
Tejo tem grandes navios
E navega nele ainda,
Para aqueles que vêem em tudo o que lá não está,
A memória das naus.
O
Tejo desce de Espanha
E o Tejo entra no mar em Portugal.
Toda a gente sabe isso.
Mas poucos sabem qual é o rio da minha aldeia
E para onde ele vai
E donde ele vem.
E por isso porque pertence a menos gente,
É mais livre e maior o rio da minha aldeia.
Pelo
Tejo vai-se para o Mundo.
Para além do Tejo há a América
E a fortuna daqueles que a encontram.
Ninguém nunca pensou no que há para além
Do rio da minha aldeia.
O
rio da minha aldeia não faz pensar em nada.
Quem está ao pé dele está só ao pé dele.
XXXIX
- O MISTÉRIO DAS COUSAS
(do "Guardador de Rebanhos" - Alberto Caeiro)
O
mistério das cousas, onde está ele?
Onde está ele que não aparece
Pelo menos a mostrar-nos que é mistério?
Que sabe o rio disso e que sabe a árvore?
E eu, que não sou mais do que eles, que sei disso?
Sempre que olho para as cousas e penso no que os homens pensam delas,
Rio como um regato que soa fresco numa pedra.
Porque
o único sentido oculto das cousas
É elas não terem sentido oculto nenhum,
É mais estranho do que todas as estranhezas
E do que os sonhos de todos os poetas
E os pensamentos de todos os filósofos,
Que as cousas sejam realmente o que parecem ser
E não haja nada que compreender.
Sim,
eis o que os meus sentidos aprenderam sozinhos:
As cousas não têm significação: têm existência.
As cousas são o único sentido oculto das cousas.
QUERO DOS DEUSES
(Ricardo
Reis)
Quero dos deuses só que me não lembrem.
Serei livre - sem dita nem desdita,
Como o vento que é a vida
Do ar que não é nada.
O ódio e o amor iguais nos buscam; ambos,
Cada um com seu modo, nos oprimem.
A quem deuses concedem
Nada tem liberdade.
(Alberto
Caeiro)
O Universo não é uma
idéia minha.
A minha idéia do Universo é que é uma idéia minha.
A noite não anoitece pelos meus olhos,
A minha idéia da noite é que anoitece por meus olhos.
Fora de eu pensar e de haver quaisquer pensamentos
A noite anoitece concretamente
E o fulgor das estrelas existe como se tivesse peso.
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