CANÇÃO DE UMA
DAMA NA SOMBRA
Quando vem a
taciturna e poda as tulipas:
Quem sai
ganhando?
Quem perde?
Quem aparece na janela?
Quem diz
primeiro o nome dela?
É alguém
que carrega meus cabelos.
Carrega-os
como quem carrega mortos nos braços.
Carrega-os
como o céu carregou meus cabelos no ano em
[que amei.
Carrega-os
assim por vaidade.
E ganha.
E não perde.
E não aparece na janela.
E não diz o
nome dela.
É alguém
que tem meus olhos.
Tem-nos
desde quando portas se fecham.
Carrega-os
no dedo, como anéis.
Carrega-os
como cacos de desejo e safira:
era já meu
irmão no outono;
conta já
os dias e noites.
E ganha.
E não
perde.
E não aparece na janela.
E diz por
último o nome dela.
É alguém
que tem o que eu disse.
Carrega-o
debaixo do braço como um embrulho.
Carrega-o
como o relógio a sua pior hora.
Carrega-o de
limiar a limiar, não o joga fora.
E não
ganha.
E perde.
E
aparece na janela.
E diz
primeiro o nome dela.
E é podado
com as tulipas.
(tradução: Claudia Cavalcanti )
CORONA
Da mão o outono
me come sua folha: somos amigos.
Descascamos o tempo das nozes e o ensinamos a andar:
o tempo retorna à casca.
No espelho é domingo,
no sonho se dorme,
a boca não mente.
Meu olho desce ao sexo da
amada:
olhamo-nos,
dizemo-nos o obscuro,
amamo-nos como ópio e memória,
dormimos como vinho nas conchas,
como o mar no raio sangrento da lua.
Entrelaçados à janela, olham-nos
da rua:
já é tempo de saber!
Tempo da pedra dispor-se a florescer,
de um coração palpitar pelo inquieto,
É tempo do tempo ser..
É tempo.
(tradução: Flávio Klothe)
CRISTAL
Não procura
nos meus lábios tua boca,
não diante da porta o forasteiro,
não no olho a lágrima.
Sete noites
acima caminha o vermelho ao vermelho,
sete corações abaixo bate a mão à porta,
sete rosas mais tarde rumoreja a fonte.
(
tradução: Claudia Cavalcanti )
DO AZUL que
ainda busca seu rosto, sou o primeiro a beber.
Vejo e bebo
de teu rastro:
Deslizas
pelos meus dedos, pérolas, e cresces!
Cresces como
todos os esquecidos
Deslizas: o
granizo negro da melancolia
Cai num
lenço, todo branco pelo aceno de despedida.
(
tradução: Claudia Cavalcanti )
DISTÂNCIAS
Olho no
olho, no frio,
deixa-nos
também começar assim:
juntos
deixa-nos
respirar o véu
que nos
esconde um do outro,
quando a
noite se dispõe a medir
o que ainda
falta chegar
de cada
forma que ela toma
para cada
forma
que ela a
nós dois emprestou.
(
tradução: Claudia Cavalcanti )
ERRÁTICO
As noites se
fixam
sob teu
olho. As sílabas re-
colhidas
pelos lábios belo,
silencioso
círculo
ajudam a
estrela rastejante
em seu
centro. A pedra,
um dia perto
da fronte, abre-se aqui:
ante todos
os
espalhados
sóis, alma,
estavas, no
éter.
(
tradução: Claudia Cavalcanti )
QUANDO ME
ABANDONEI EM TI,
eras
pensamento,
algo
murmura
entre nós dois:
do mundo a
primeira
das últimas
asas,
em mim
cresce
a pele
sobre
tempestuosa
boca,
tu
não chegas
até
ti.
(
tradução: Claudia Cavalcanti )
COMO TE
EXTINGUES em mim:
ainda no
último
e gasto
nó de ar
estás lá
com uma
faísca
de vida.
(
tradução: Claudia Cavalcanti )
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