Súplica ao entardecer

longa é a hora do suplício.
a súplica ao entardecer
descolore o olhão lilás de deus
mas não muda a rota da carruagem de fogo
que mergulha no mar nos deixando sem sombras.
.
contudo, a esperança é uma ponte
por onde as almas vagam
quando a terra é encharcada e escura e assustadora.
.
enquanto o raio é a chance única de ver teu rosto
o amor se refugia nas montanhas
entre outros bichos igualmente perigosos.

.
fraturas do tempo

sinto a correria dos anjos,
os pequeninos anjos na escada, onde vão?
(exasperado, não sei o caminho:
 
as fraturas
do tempo
expostas
em minha
carne)

.
segundo poema inelutável

Sinelutável! dizem os poemas sem sentido
.
os sapos conhecem a epiderme das águas
mas os peixes conhecem-na mais
.
deitam-se
sapos
poetas
&
peixes
à sombra de poemas
sem sentido

rasuras

sobre o caderno do colégio mofado
participo uma vez mais da infância

combato o obscuro
mas tudo o que desvelo são miragens do que não foi
a família sem mortes
que o menino sonhara

.
não me avisaram de teu pouso

Quando te vi no início
- nas linhas do livro -
o sol trabalhava a louça azul esmaltada
os pássaros moravam em teus calcanhares
.e voavas.
.
Quando te vi novamente
- no fim do filme -
o musgo trabalhava a lousa fria póstuma
mas teu epitáfio era legível:
A morte tem o peso de um pouso